domingo, 26 de março de 2017

A aurora da Primeira Comunhão

Como a mãe é necessária na formação para a primeira comunhão das meninas


Transcorre o tempo, passa o ano da primeira comunhão, e chega-se presto ao momento apetecido que o deve terminar. À proporção que se aproxima, deve redobrar a atenção da mãe sobre a filha e da filha sobre si própria; são-lhes comuns os sentimentos, os desejos, os votos e as orações, pois se assim não fosse não se amariam. É preciso que cresçam diariamente o ardor de uns e o fervor de outros, é preciso que formem a bola de neve. Rolando de contínuo aumentará progressivamente, e no seu rápido e firme curso aplanará as protuberâncias do orgulho, derrubará os obstáculos da vontade, igualará as sinuosidades do caráter, preparará a via do Senhor e tornará retas  e planas as suas veredas (São Mateus), e até as aformoseará com sua deslumbrante bravura.

Deste modo se chega ao dia precioso e santo, prelúdio de outro dia ainda mais santo e mais precioso. Dia de arrependimento e de perdão, cuja pena e doce tristeza dispõe para a serena e perfeita felicidade do dia seguinte; porque as emoções que vêm de Deus, dores ou alegrias, consolações ou sofrimentos, trazem consigo alguma coisa do seu imutável repouso, e quando entra Jesus Cristo numa alma, é para dizer-lhe: A Paz seja contigo!

Ah! Ditosa mãe se preparaste bem essa formosa alma infantil! Goza com ela essa paz que o mundo não pode dar (São João), e pela qual, uma vez experimentada, se diria adeus sem pena assim a ele como a todas suas venturas. Se a dispuseste bem, não te recusará Deus,  nem tão pouco a ela, essas alegrias tão plácidas e não obstantes tão vivas, essas emoções tão forte e todavia tão doce.


Acompanha-a, apresenta-te com ela neste tribunal sagrado, objeto de terrores do escravo, mas motivo de confiança para as crianças que sabe amar. Ide, teus pecados lhe serão perdoados (São Lucas), e também os teus; porque quando uma pessoa se preparou como ela, com fervor tão perseverante; quando uma pessoa empregou tanta generosa dedicação, como tu em auxiliá-la é porque amou muito e bem sabes que em tal caso pode ir em paz.

Vai: o sangue do cordeiro rociará as vossas cabeças, e não entrará em vossas cabeças, e não entrará em vossa casa o anjo exterminador. Vai e sentirá de novo ao lado de sua filha tudo quanto experimentasse em menina em igual dia: esta primeira absolvição renovada levará a tua à cândida doçura dos primeiros sentimentos.

Sim, se a aurora da primeira comunhão é a do dia mais formoso da vida, o dia que a precede é o seu princípio: assim vos  dirão vossos filhos e também as vossas recordações. Eu te absolvo, eis aí o seu ponto de partida, eis aí as palavras que dão direito a ouvir estas outras: Ide em paz! E não é então a paz da terra a que desce, senão a do céu. E desde esse instante tudo é belo, tudo fala ao coração, tudo, até os usos ao parecer mais simples e menores, que lhe fazem vibrar as cordas mais sensíveis. Ah! É porque nada é pequeno para Aquele ante o qual nada é grande, ou antes, tudo  é grande quando é Ele seu objeto. O ato mais oculto, a criancinha mais desprezada, levada pelas mãos da religião como um filho nos braços de sua mãe, sobe até o trono de Deus; e Deus para recebê-la inclina as alturas do céu.

E veja-se, com efeito, como tudo é enobrecido pelo pensamento religioso, e como tudo se acha bem escolhido pela Igreja, não só as obrigações que impõe, senão também os costumes que aprova e as práticas que aconselha. Segue a criança ao sair da piscina em que se purificou, e julgareis se é e não assim. Bem sabe que está absolvida, porém quer apagar ainda até os vestígios das suas culpas. Ah! Não é difícil então obter o perdão de sua boca orgulhosa; pelo contrário, tem sede de perdão, quisera pedi-lo a todo universo, e não julgaria pagar assim muito cara a mínima parcela da sua felicidade: é tão grande a que experimenta! E sente-se tão pequena!

Ah! Qual mãe então não chora? Qual coração não se sente impressionado? Qual estranho não se sente comovido?

Ditosa a mãe que sente correr, sem mescla de amargura, lágrimas tão  doces que se quisera contê-la para se derramarem por mais tempo! Porque esta mãe já tem a confiança do seu filho, e sabe que Deus se serviu das suas mãos para fazer dele um anjo.

Quando levantaste tua filha e, estreitando-as nos braços, chorais juntas, fala-lhe do futuro do que Deus espera dela e lhe pede por meio de ti. Fala-lhe do valor necessário à mulher e de que pôde prover-se agora; fala-lhes dos defeitos ainda só meio desarraigados e que lhe preparam contínuos combates. Repete-lhes as palavras de Cristo: Minha filha, abstêm-se de pecar de agora em diante, para que não sejas mais desgraçadas do que tem sido.(São João). Recorde-lhes todas as resoluções já tomadas e deve renovar solenemente. Encarrega-a de orar por ti, pela sua família toda; e, se há nesta família algum membro a quem seja desconhecida a felicidade que ela goza, dize-lhe que reúna em favor dele todo o poder do seu amor, todo o fervor da sua fé, e que derrame todas as lágrimas do seu coração. Então talvez, ao entrar Deus pela primeira vez nessa alma, procederá como os príncipes, sua imagem na terra, usando do direito de graça, do privilégio duma fausta exaltação ao trono. E haverá mais do que uma alegria no céu, e na terra mais de uma felicidade.

Finalmente, regozijai-vos e exultai de alegria, pois  eis aqui o dia que fez o Senhor, e fê-lo um Deus. Tende cuidado, vós todos que rodeais aquela cuja inocência espera os seus favores, tende cuidado! Não vades manchar essa túnica nupcial, ofuscar o brilho dessa consciência purificada, distrair esse espírito que só deve encher Deus e imergir de novo essa alma,, que já está no céu, nas preocupações da terra. Não vá perturbar esse silencioso recolhimento, porque a sua conversação é interior (cântico dos cânticos), e Deus vos pediria contas de todas as palavras que lhes houvesse usurpado. Mas, sobretudo não vá, com a vaidade das mães, rasgar os adornos da alma para enfeitardes o corpo; não desvieis olhares e pensamentos que se erguem ao alto para abaixar para a coisa menor que existe – a vaidade de um vestuário! Deixai as rivalidades do amor próprio a quem se atreve a disputa-las num momento tão santo, e não vos sirvais dela para afogar os ardentes suspiros e os fervidos impulsos de um coração cujo gozo já vos não pertence. Ah! Essa menina é de Deus; não façais dela um espetáculo para os homens, adornai nela o homem interior; mas ao homem exterior deixai-lhe por ornato essa simplicidade, através da qual pode refletir-se livremente a beleza da alma.

Com ela, deve ter-te purificado nas águas tiradas da mesma fonte; com ela foste perdoada no mesmo tribunal; apresenta-te como ela e com ela à mesma mesa: O vosso Deus é o seu Deus, e o vosso povo o seu povo (Rute); caminha avante; mostra-lhe a terra católica de Israel; respingai juntas o mais puro trigo da Igreja: o dono disse aos seus ceifadores que deixem cair espigas para vós; fugi com presteza da fome que existe em outros lugares, e, seguindo por todas as partes essa menina, guarde e uma o corpo de Nosso Senhor Jesus Cristo às vossas almas para a vida eterna.

Renova como ela, à noite, as sagradas promessas do batismo, e, entregando-as nas mãos de Maria, consagrai-vos juntas a essa Virgem sempre isenta do pecado, e, contudo, refúgio dos pecadores. Tu, mãe, pede-lhe que te ensine a sê-lo e confia-lhe tua filha que é também filha sua. Sendo Maria Virgem e mãe, presta-lhes por esses dois títulos uma proteção especial a ti e a ela; e assim a esposa virgem de Jesus Cristo, a Igreja, mães dos mesmos filhos de Maria, a invoca em favor das virgens, e a implora em prol das mães.

Sim, promete a Deus neste dia e aos pés de Maria os sacrifícios que até agora reclamou talvez em vão; provê-te de força e de valor, que nunca se possui em demasia, e ora. Ora por essa querida menina. Pede para ela constância na fé, e perseverança na caridade; solicita, não a abundância da terra mas o gozo do céu; dize a Deus que preferias perde-la inocente a conservá-la culpada; entrega-lhe inteiramente, e oxalá seja a tua oferenda também inteiramente aceita! Ah! Se tens realmente coração de mãe e alma católica, nunca orarás melhor do que neste dia, em que, entrando Jesus Cristo por todas as portas da casa, declarará que veio trazer-lhe a salvação: Em verdade, este dia é um dia de salvação para esta casa (São Lucas 19:9).



Fonte: A mulher cristã desde o nascimento até a morte – Mme. M. de Marcey


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