segunda-feira, 28 de março de 2016

Entrevista com Mons. Bernard Fellay, 4 de março de 2016 em Menzingen (Suíça)

Mgr Bernard Fellay.



Desde há várias semanas numerosos rumores têm circulado na imprensa  sobre um possível reconhecimento canônico da FSSPX por Roma. Em vez de aumentar esses rumores com comentários, DICI escolheu entrevistar o Superior Geral da Fraternidade, Dom Bernard Fellay, a fim de solicitar uma avaliação dos pontos seguinte:

As relações da Fraternidade São Pio X com Roma
As novas propostas Roma
“Ser aceito como nós somos”
O Papa e a FSSPX
A jurisdição concedida aos padres da FSSPX
As visitas dos bispos enviados por Roma
O estado atual da Igreja
O que devemos pedir à Santíssima Virgem?


1. As relações da Fraternidade São Pio X com Roma desde 2000


As relações com Roma, de fato, continuam, embora essa palavra não é inteiramente correta ... porque eles nunca interromperam certamente nunca se quebraram, embora a sua frequência tem variado, e sua intensidade também ... Podemos dizer que desde 2000, tem ocorrido contatos com Roma. As autoridades romanas foram  quem solicitaram esses contatos, a fim de regularizar a situação da Fraternidade. Houve altos e baixos, como eu disse, mas a partir do Cardeal Castrillon Hoyos, em 2000, os contatos têm sido, por algum tempo, bastante frequente. Depois de nossas condições terem sido bem estabelecidas, houve um momento em que as relações foram ... não quero usar a palavra suspensa, mas quase. Em 2005, houve um único contato. E depois de 2009, ou seja, no momento do levantamento - o que chamamos de levantamento das excomunhões; dizemos: a retificação do decreto de excomunhão - tem sido um contato mais regular, especialmente com discussões doutrinárias, que foram solicitadas por ambos os lados e duraram cerca de dois anos . Em seguida, surge novamente o que poderíamos chamar de uma nova etapa, desta vez envolveu uma proposta de solução, a qual era dupla: havia uma declaração doutrinária e uma solução canônica. Isso durou quase um ano, mas fracassaram.

Então, por dois anos  as relações ficaram escassas, para retomar, acho que podemos dizer, com o regresso de Monsenhor Pozzo à Pontifícia Comissão Ecclesia Dei. Durante o tempo do arcebispo Di Noia houve alguns contatos, é verdade, mas com Monsenhor Pozzo uma nova etapa, que foi novamente dupla. Por um lado, debates, ou seja, discussões doutrinárias de uma forma mais flexível, portanto, não totalmente oficial, mas mais do que apenas extra-oficialmente, uma vez que estes bispos foram enviados por Roma. Essas discussões ainda estão em andamento. Eu acho que vale a pena o esforço. Ao mesmo tempo, em outro plano, e em certo sentido, paralelamente, houve uma nova proposta em julho passado: um convite à reflexão para encontrar maneiras de conseguir a regularização canônica. E também aqui, essas discussões, essas reflexões estão avançando. Não há pressa, isso é claro. Será que estamos realmente progredindo? Penso que sim. Eu acho que sim, mas é certamente um processo lento.

 2. As propostas de Roma estudadas pelos superiores maiores da Fraternidade São Pio X.

Queremos envolver um grande número de confrades, a partir do topo, em nossa reflexão sobre as novas propostas de Roma. Eu acho que é importante. Nós aprendemos algumas lições do que aconteceu em 2012, o que causou atrito dentro da fraternidade. Eu acho que uma das razões foi a falta de comunicação. Foi um período um pouco difícil. Da mesma forma, desta vez nós escolhemos uma maneira diferente de abordar estas questões, que exigem muita reflexão.

Quando vemos a situação de Roma, a Igreja, obviamente, não nos sentimos encorajados a agir. É compreensível que Roma quer fazer um convite, e representam um problema para a Igreja. Quando vemos todos os esforços feitos em prol do ecumenismo - para alcançar Deus com sabe que tipo de união! - E quando vemos como somos tratados na Igreja, isso significa, é claro, que representam um problema. Nós somos um grande espinho para todo o sistema ecumênico atual. Isso por si só seria suficiente para explicar (o comportamento adotado por Roma). Acho que não apenas isso, mas em qualquer caso - independentemente de seus motivos diretamente - há um movimento de Roma para tentar resolver o problema.

Por outro lado, vemos a situação dramática da Igreja, onde realmente não há muitos estímulos que nos convidam a ir em frente. Por isso, a reflexão profunda é necessária, mas não será realizada isoladamente. Precisamos de vários pares de olhos para observar corretamente, para refletir sobre as implicações dessas questões. Por isso que queria pedir a todos os superiores suas reflexões sobre este assunto.

 

3. “Sermos aceitos tal como somos” sem ambiguidades nem compromissos.

 

É absolutamente necessário evitar qualquer compromisso; entendamos “compromisso” de duas maneiras. Compromisso no sentido de que cada uma das partes cede algo para assegurar outra coisa. Desde o início, havia sido dito a  Roma: “Eu não quero qualquer ambiguidade. Se você quiser chegar a um consenso sobre um documento que é entendido de forma diferente por cada uma das partes, seria criar o caos, que se desataria em pouco tempo”. Portanto, é absolutamente necessário evitar isso. É quase óbvio que, no início, devido a atual situação e aos pontos de vista divergentes, o documento tenderá a ambiguidade. E nós não queremos isso em absoluto.

Obviamente, que isso nos faz “rígidos”, por assim dizer. Em qualquer caso, bastante rígido, o que complica ainda mais as coisas, mas para nós não há uma solução simples. Poderíamos dizer: “Sim, em teoria, é a solução da verdade, mas a verdade deve ser total e completa”.

Esta é a abordagem inicial que eu considerava importante adotar com Roma. E no que diz respeito ao primeiro documento, eu disse a eles: “É ambíguo, não vai funcionar, não quero absolutamente nada disso”. Foi o primeiro documento em 2011. Desta vez, eu acho que a situação está muito melhor. De fato, tem havido progressos significativos neste sentido, contra a ambiguidade. Isso não significa que foi removida toda a ambigüidade ...

Além da questão da clareza do documento, há uma outra, questão muito mais importante e mais profunda: Que margem, que liberdade nos concederia ou que nos concederá em caso de regularização? E, neste contexto, tomei como ponto de partida uma frase que foi a exigência prática de Monsenhor Lefebvre que considerou como uma condição sine qua non para a regularização; Especificamente, a de sermos aceitos como somos.

Portanto, eu queria dizer a eles (Roma): “Se quiser, é assim que somos; . Vocês tem que nos conhecer;  para que  não poder nos dizer depois que escondemos as coisas. Assim é como nós somos e é assim que continuaremos sendo”. Nós vamos permanecer como somos, por quê? Não é uma questão de teimosia; não significa que nos consideramos  melhor; é a Igreja que tem ensinado essas coisas e que as exigi. Não é apenas a fé; há também uma disciplina que está em perfeito acordo com esta fé, e este foi o tesouro da Igreja, isto foi o que formou no passado tantos santos, e não estamos dispostos a desistir. No trato com Roma, tenho insistido muito dizendo: “Assim é como somos, assim é como pensamos”, inclusive tenho dado exemplos concretos, e se Roma considera que estes pensamentos e esta posição devem ser corrigidos ou modificados, então eles têm que fazer-nos saber agora. Ao mesmo tempo eu expliquei a eles que, se não for assim, não seguiremos adiante.

 

4. O Papa e a Fraternidade São Pio X: benevolência paradoxal.

 

É necessário usar o termo “paradoxal”, o paradoxo de querer avançar em direção ao que quase poderíamos chamar de “Vaticano III” no pior sentido que pode ser dado a este termo, e por outro lado, quer dizer à Fraternidade: “Aqui são bem-vindos”. Isto é verdadeiramente um paradoxo, quase uma vontade de combinar opostos. Eu não acho que isso seja para o ecumenismo. Alguns poderia pensar. Por que eu não acho que isso é para o ecumenismo? Porque basta observar a atitude geral dos bispos neste tema do ecumenismo: Eles têm braços abertos para qualquer um, exceto para nós! Em numerosas ocasiões, as pessoas têm tentado explicar por que fomos excluídos, dizendo: “Não os tratam como os outros, porque vocês afirmam ser católicos. Ao dizer isso, criam confusão entre nós e, portanto, não os querem”. Ouvimos esta explicação muitas vezes, e ela exclui o ecumenismo. Mas se essa abordagem for para dizer: “Aceitamos todos dentro da família”, não é aplicável em nosso caso, então, o que resta? Eu acho que o Papa é o que resta.


Se no princípio Bento XVI, e agora Papa Francisco não enxergam a Fraternidade de uma maneira particular, que é diferente dessa perspectiva ecumênica que eu acabei de mencionar, eu acho que agora não haveria nada em absoluto. Eu acho que, em vez disso, estaríamos a caminhar novamente sob sanções, censuras, excomunhões, declarações de cisma e intentos para eliminar um grupo problemático. Então, por que tanto Bento XVI e o Papa Francisco têm sido tão benevolente para com a Fraternidade? Eu acho que a perspectiva de ambos não é necessariamente a mesma. No caso de Bento XVI, eu acho que foi devido ao seu lado conservador, o seu amor pela antiga liturgia, seu respeito pela disciplina que existia na Igreja. Posso dizer que muitos, e eu estou falando de muitos sacerdotes, e até mesmo grupos que tiveram problemas com os modernistas na Igreja, e eles recorreram a ele quando ele ainda era cardeal, encontrado nele, primeiro como cardeal e depois como papa, um olhar benevolente e um desejo de proteger e ajudá-los, pelo menos, em tudo o que podia.

 

Enquanto ao papa Francisco, não vemos esta fixação na liturgia ou na disciplina anterior da Igreja. Poderíamos mesmo dizer muito pelo contrário, por causa de suas muitas declarações contra, torna-se mais difícil e complicado de entender sua benevolência. E, no entanto, eu acho que há várias explicações possíveis, mas eu admito que não tenho a última palavra sobre este assunto. Uma das explicações é o enfoque do Papa Francisco a qualquer coisa que seja marginalizada, o que ele chama de “as periferias existenciais”. Eu não ficaria surpreso ao considerar-nos como uma dessas periferias por ter uma preferência manifesta. E, a partir dessa perspectiva, ele usa a expressão “recorrer um caminho” com as pessoas que estão na periferia, na esperança de melhorar as coisas. Portanto, não se trata de uma decisão estabelecida para encerrar imediatamente: um processo, um caminho vá aonde este vá ... mas pelo menos é bastante calmo, amigável, sem saber qual será o resultado. Talvez esta seja uma das razões mais profundas.


Outra razão: nós vemos que o Papa Francisco constantemente critica a Igreja estabelecida, a palavra usada em Inglês para isso é
establishment- também utilizado em francês, ocasionalmente - reprovando a Igreja por ser autocomplacente, suficiente por si mesma, por ser uma igreja que já não vai em busca da ovelha perdida, da ovelha que sofre, em todos os âmbitos, pela pobreza até mesmo fisicamente ... Mas nós vemos no Papa Francisco que esta preocupação, apesar das aparências óbvias, não só é uma preocupação sobre as coisas materiais ... Vemos claramente que, quando diz “pobreza”,  refere-se também a pobreza espiritual, a pobreza das almas que estão no pecado e deveriam serem removidas desse estado e levadas de volta para Deus. Embora nem sempre se expressa de forma tão clara, podemos encontrar várias expressões que indicam isso. E a partir dessa perspectiva, vê na Fraternidade uma comunidade que é muito ativa, especialmente quando comparada com a situação dentro do establishment, muito ativa, em outras palavras, que busca, que sai à procurar as almas, que têm essa preocupação peço bem espiritual das almas, e está pronta para colocar as mãos na obra e trabalhar para ele.


Conhece a Monsenhor Lefebvre,  leu duas vezes a biografia escrita por Dom Tissier de Mallerais, o que mostra, sem sombra de dúvida, um interesse; e acho que ele gostou. E também os contatos estabelecidos na Argentina com nossos confrades, em quem vio a espontaneidade e franqueza, pois não escodemos absolutamente nada. Claro se tentávamos obter algo para a Argentina, onde tivemos dificuldades com o Estado sobre autorizações de residência, mas não escondemos nada, não tentamos fugir de qualquer problema, e eu acho que ele isso ele gosta. Este talvez seja o lado humano da Fraternidade, mas vemos que o Papa é muito humano, atribui grande importância a estas considerações, e isso pode explicar alguma boa vontade de sua parte. Reitero, mais uma vez, não tenho a última palavra sobre esta questão e, certamente, por trás de tudo isso é a Divina Providência que consegue colocar bons pensamentos na cabeça do Papa, que, em muitos aspectos, nos alarme tremendamente, não apenas a nós: podemos dizer que qualquer um que seja mais ou menos conservador na Igreja tem medo do que está acontecendo, pelas coisas que são ditas, e, sem embargo, a Divina Providence ainda consegue fazer-nos passar por obstáculos de uma maneira muito surpreendente. Muito surpreendente, porque é claro que o Papa Francisco quer deixar-nos viver e sobreviver. Ele ainda disse a todos que querem ouvir, que nunca prejudicaria a Fraternidade. Ele também disse que somos católicos. Ele se recusou a nos condenar como cismáticos, dizendo: “Eles não são cismáticos, são católicos”, mesmo que ele tenha usado uma expressão um tanto enigmática, ou seja, que estamos a caminhar rumo à “plena comunhão”. Queríamos saber uma definição clara de “plena comunhão”, porque é claro que não corresponde a nada preciso. É um sentimento ... não sabemos o que é. Mesmo recentemente, em uma entrevista com Monsenhor Pozzo sobre nós, ele repete uma citação atribuída ao próprio Papa - portanto, podemos considerar isso como uma posição oficial: o Papa, falando a Ecclesia Dei, confirmou que somos católicos no caminho para a “plena comunhão”. E Monsenhor Pozzo explicou como pode ser alcançada a plena comunhão: aceitando a forma canônica, o que é bastante surpreendente: a forma canônica iria resolver todos os problemas relativos à comunhão!
Um pouco mais adiante, na mesma entrevista, ele disse que esta comunhão plena é aceitar os grandes princípios católicos, em outras palavras, os três níveis de unidade na Igreja, que são, fé, sacramentos e governo. Quando se fala de fé, refere-se sim ao magistério. Mas nós nunca questionamos qualquer um desses três elementos. E, por outro lado, nós nunca pomos em dúvida a nossa plena comunhão, mas removemos o adjetivo “pleno”, para dizer simplesmente: “Estamos em comunhão de acordo com o termo clássico usado na Igreja; somos católicos; se somos católicos estamos em comunhão, porque a ruptura da comunhão é precisamente um cisma.”

 

5. A jusrisdição concedidadas aos sacerdotes da Fraternidade São Pio X: consequências canônicas.

 

Se considerarmos o direito canônico da Igreja, ninguém é sujeito a um poder ordinário de jurisdição na Igreja, a menos que sua situação esteja perfeitamente regular. Isto é, uma pessoa que não está afetada pela censura. Roma sempre disse e sustentou que os nossos sacerdotes estão sob a censura de suspensão porque eles não estão incardinados. Nós dizemos que é claro que eles são incardinados na Fraternidade, que era, na época, injusta ou invalidamente suprimida, indo contra as leis da Igreja; mas, no entanto, Roma manteve e mantém até hoje que nossos padres estão suspensos. Suspensão, o que isso significa? Isso significa precisamente que o padre é proibido de exercer o seu ministério, se refere da missa e os outros sacramentos, incluindo a confissão. Agora, conceder uma jurisdição ordinária a confessar , não excepcionalmente, como no caso de perigo de morte ... A Igreja, de fato, prever tais situações: se alguém está em perigo de morte, se for encontrado perto da morte após um acidente de trânsito, qualquer sacerdote, independentemente do seu estado, até mesmo um padre excomungado ou um ortodoxo, que nem sequer é católico, mas é um padre válido, então você pode confessar à pessoa e dar a absolvição não apenas de forma válida, mas legalmente. Estes são casos excepcionais. Não é um “poder ordinário”. Aqui estamos a falar de uma fonte comum. Para ter e exercer o poder ordinário de jurisdição é necessário, uma vez mais, ser livre de censura. A partir do momento que o Papa declara que este nos dá poder ordinário implica, por isso mesmo, a eliminação, a abolição da censura. Esta é a única maneira de entender este regulamento em conformidade com o Direito Canônico, não só de acordo com a letra deste ou aquele cânon, mas no espírito do Direito da Igreja.

 

 

6. Visitas dos prelados enviados por Roma: algumas questões abertas?

 

Estas visitas têm sido muito interessante. Obviamente, algumas pessoas da Fraternidade têm visto com certa desconfiança: “O que está fazendo esses bispos em nossa casa?” Bom! Essa não era minha perspectiva. O convite veio de Roma, talvez como resultado de uma ideia que eu sugeri, e que era o seguinte: "Vocês não nos conhece; Estamos falando de um escritório aqui em Roma; venham ver-nos diretamente, não podem realmente nos conhecer  a menos que nos vejam”. Uma declaração sem se importar de haver ou não um grande sucesso na Internet, ou fazer um comunicado não fará que nos conheçam como somos .; porque a maioria das vezes acontece que somos forçados a tomar uma posição, e até mesmo a condenar qualquer expressão ou ação sobre a Igreja nestas declarações, mas nossas vidas como católicos, não se resume apenas a isso. Na verdade, podemos até dizer que as coisas essenciais estão em outro lugar. O essencial é a intenção de viver o nosso catolicismo seguir os mandamentos de Deus, esforçando-se para nos santificar, evitar o pecado, viver de acordo com toda a disciplina da Igreja. Nossas escolas, nossos seminários, os nossos sacerdotes, a nossa vida sacerdotal, tudo isso é um conjunto que é a realidade, a verdadeira realidade da nossa Fraternidade.

Portanto, eu colocou ênfase especial, no que eu disse várias vezes: “Venha conhecer-nos”. Nunca quiseram. De repente, veio esta proposta de enviar alguns bispos para reunião. E pela minha parte, não importa qual era a intenção original de Roma, estive de acordo que era uma boa ideia. Por quê? Pois assim nos veriam como realmente somos. Esse foi o slogan que dei em cada um dos lugares que visitaram: “Nós não estamos mudando nada, não estamos tentando embelezar as coisas, somos o que somos, e deixemos ver-nos exatamente dessa forma”. E, de fato , um cardeal, um arcebispo e dois bispos vieram nos ver, a visitar-nos, em diferentes situações, por vezes, nos seminários e também em um dos conventos. As primeiras impressões, os comentários feitos durante estas discussões, durante as reuniões e após elas são muito interessantes. E eu acho que me dão a razão em ter apoiado este convite romano.

 

A primeira coisa que todos nos disseram – se trata de uma linha oficial ou opinião pessoal? Eu não sei, mas o fato é - todos nos disseram: “Estas discussões estão ocorrendo entre católicos; isso não tem nada a ver com discussões ecumênicas; estamos entre os católicos”. Portanto, desde o início eles colocaram de lado todas aquelas ideias como: “Eles não estão completamente dentro da Igreja, estão a meio caminho, portanto, estão fora - só Deus sabe onde.! - Cismáticos ...” Não! Estamos a falar entre os católicos. Este é o primeiro ponto, o qual é muito interessante, muito importante. Apesar do que, em alguns casos, ainda se diz em Roma.



O segundo ponto - que na minha opinião é ainda mais importante - é que as questões abordadas nestas discussões são os temas clássicos que sempre foram obstáculos. Quer se trate de uma questão de liberdade religiosa, a colegialidade, o ecumenismo, a Missa Nova, ou mesmo os novos ritos dos sacramentos ... Bem, todos nos disseram que estas discussões eram sobre as questões abertas. Eu acho que esta reflexão é capital. Até agora, eles tinham sempre insistido em deixar bem claro que tínhamos de aceitar o Concílio. É difícil determinar com precisão a verdadeira extensão desta expressão: “aceitar o Concílio”. Que significa? Porque é um fato de que os documentos do Concílio são completamente desiguais, e que sua aceitação se faz através de uma abordagem gradual, em uma escala de obrigação. Se um texto é um texto de fé, existe uma obrigação simples e pura. Mas aqueles que defendem, de uma forma completamente errada, que este concílio é infalível, exigem a submissão total ao Concílio. Então, se isso é o que significa “aceitar o Concílio”, dizemos que nós não aceitamos. Precisamente porque o que negamos é a sua infalibilidade. Se há algumas passagens dos documentos conciliares que repetem o que a Igreja já disse antes infalivelmente, obviamente, essas passagens são e permanecem infalíveis. E nós aceitarmos, não há nenhum problema. Então, quando você diz “aceitar o Conselho”, é necessário distinguir claramente o significado do termo. No entanto, mesmo com esta distinção, até agora, temos detectado uma insistência por parte de Roma: “Eles devem aceitar estes pontos; são parte do ensinamento da Igreja e, portanto, devem aceita-los”. E até hoje - não só em Roma, mas também na maioria dos bispos -. vemos esta atitude em relação a nós, essa censura grave:” Vocês não aceitam o Concílio.”




E agora, de repente, os enviados de Roma dizem-nos que todos os pontos que tinham sido obstáculos, são questões abertas. Uma questão em aberto é uma questão que pode ser discutida. E a obrigação de aderir a uma determinada posição é forte e até, talvez, totalmente atenuada ou eliminada. Eu acho que este é um ponto crucial. Nós vamos ter que ver, então, se isso for confirmado, se realmente podemos discutir livremente, ou melhor, sinceramente, com todo o respeito à autoridade, para não agravar ainda mais a situação atual na Igreja, que é tão confusa, precisamente porque a fé, tudo o que devemos crer, e é aí que nós exigimos esta clareza, esses esclarecimentos por parte das autoridades. Nós pedimos isso por um longo tempo. Nós dizemos: “Há pontos ambíguos neste Concílio, e não cabe nós a explicitá-los. Podemos apontar o problema, mas quem tem a autoridade para esclarecer é Roma.” No entanto, reitero que estes bispos dizem-nos que eles já são questões abertas, em minha opinião, algo crucial.




As discussões em si têm sido desenvolvidas, mais ou menos feliz, de acordo com a personalidade dos nossos interlocutores, porque houve também boas trocas [em que] não necessariamente estivemos de acordo ... No entanto, eu acho que todas as partes são unânimes na sua avaliação: eles ficaram satisfeitos com as discussões. Da mesma forma, eles estavam satisfeitos com suas visitas. Nos felicitaram com a qualidade dos nossos seminários, dizendo: “Eles são normais (Felizmente você tem que começar por aí ...!), Essas pessoas não são intolerantes ou obtusas, mas animadas, abertas, alegres, apenas  indivíduos normais. E este comentário foi feito por todos os visitantes. Sem dúvida, este é o lado humano, mas não devemos esquecer tampouco.




Para mim, essas discussões, ou mais precisamente a faceta mais sensível da discussão é importante porque um dos problemas é a desconfiança. Certamente temos essa desconfiança. E eu acho que, sem dúvida, Roma também tem sobre nós. E enquanto essa desconfiança prevalece, a tendência natural é que tomemos qualquer coisa que é dita de forma equivocada, ou que assumamos o pior cenário possível. À medida que continuamos com essa mentalidade suspeita, não podemos fazer muito progresso. É preciso haver um grau mínimo de confiança, um clima de serenidade, para eliminar essas alegações a priori. Eu acho que a nossa mentalidade ainda está presente, e também a de Roma. Isso leva tempo. Ambos os lados devem apreciar devidamente as pessoas, as suas intenções para superar tudo isso. Eu acho que isso vai levar algum tempo.




Isso também requer ações que mostrem boa vontade, e não pretendam nos destruir. Atualmente, ainda temos essa ideia em nossas mentes, que é uma atitude generalizada: “Se nos querem é para nos sufocar, e, eventualmente, destruir, para nos absorver totalmente e desintegrar-nos.” Isso não é integração é desintegração! Obviamente, a ideia prevalece, não podemos esperar nada.


 

7. O estado atual da Igreja: inquietitudes e esperanças.

 

Me dá muito trabalho discernir uma linha de ação do que está acontecendo. Eu vejo uma crescente confusão que é precisamente o resultado de elementos contraditórios, diluição de doutrina, moral, disciplina. Tudo isto está a conduzir a um sistema em que cada um tem que cuidar de si mesmo. Os bispos dizem o que querem, contradizendo uns aos outros. Não há apelos oficiais, claro, a ordem, nem mesmo chamadas para qualquer direção de uma forma ou de outra. Alguns anos atrás, havia ainda uma linha. Era a linha modernista. Foi o famoso espírito do Concílio Vaticano II. Atualmente, vemos um profundo desacordo sobre estas questões entre os bispos e até mesmo em Roma. Que linha triunfará? Que linha vai prevalecer? No momento, eu não posso dar a resposta.

Obviamente, podemos com base em determinadas reflexões, certas indicações, dizendo que é claro que mais progresso alcançamos, mais eles se enfraquecem ou são enfraquecidos os modernistas. Estes, precisam dde fiéis precisam de vocações; É uma igreja que definha. E isso é verdade. Além disso, entre os jovens, vemos um número - é difícil fazer um cálculo correto, mas é consistente o suficiente para fazer a observação - eles querem uma Igreja muito mais séria, em todos os aspectos, em particular no nível doutrinário. seminaristas jovens que querem São Tomás, que querem um retorno a uma filosofia sã, uma teologia clara, saudável e a escolástica da teologia São Tomás. Vejo também entre estes jovens o desejo de uma liturgia ... não a chamada de “renovada”, mas sim um retorno à liturgia tradicional. E o número de jovens parece impressionante. Não podemos calculá-lo facilmente, mas quando ouvimos os sacerdotes que trabalham com esses jovens nos seminários modernistas, alguns até conseguem dizer que 50% dos novos seminaristas na França e Inglaterra aspiram à Missa Tradicional.
Parece-me um bom número, e eu espero que seja verdade.

Sem dúvidas, vemos muito claramente esboçado que esta linha é uma linha ascendente e ao longo dos anos vemos essa tendência crescente. Como exemplo, desde o ano passado, com o problema do Sínodo sobre o casamento, da família católica, se tem visto um contraste mais acentuado entre os dois campos. Creio que isso é devido a um fortalecimento dos conservadores, crescendo, se não em números, mas, pelo menos em sua intensidade sem dúvida.
E por outro lado, a maioria que claramente continua a ser a parte dominante, mas perde força e não impõe condições, pelo menos, para impor absolutamente tudo como costumava fazer antes.

E por isso há estas duas linhas. Qual é o nosso futuro nesta situação? Primeiro de tudo, devemos permanecer firmes. Há uma grande confusão. Quém ganhará? Ninguém sabe. Isso faz com que as nossas relações com Roma sejam extremamente difíceis porque estamos a falar com um interlocutor sem saber se no dia seguinte o documento que temos finalmente conseguido chegar a um acordo, depois de muitas discussões, será, de fato, o texto final. Vimos em 2012 como um documento foi editado, alterado por uma interferência ... por uma autoridade superior, no entanto, não foi o Papa. Novamente surge a pergunta: quem governa a Igreja? Eu diria que esta é uma pergunta muito interessante que permanece sem resposta. Se trata de forças ... indeterminadas!.

 

 

8. O que devemos pedir-lhe a Santíssima Virgem?   

 

Ah! Muitas coisas. Primeiro de tudo a salvação. A nossa salvação, de todas as pessoas, cada uma das almas que vêm para a Fraternidade, que estão dispostas  a encomendar-se a ela, seus sacerdotes, e, portanto, vamos pedir a Ela a fidelidade para a Fraternidade. Fidelidade à Igreja, a fidelidade a todo o tesouro da Igreja, que - Deus sabe por que, só Deus sabe como - está em nossas mãos, um patrimônio extraordinário que é o tesouro da Igreja, que não pertence a nós, e nosso único desejo é o de recuperar o seu lugar, o seu lugar de direito dentro da Igreja.

Peçamos o triunfo da Virgem. Ela anunciou isso. Eu diria que esta vitória vale a pena esperar, talvez estamos ainda um pouco impaciente, especialmente quando vemos tudo o que está acontecendo e que parece ser uma contradição; é simplesmente um desenvolvimento que Deus permite, um jogo aterrador e terrível: o descompasso entre a liberdade humana, mesmo entre os cristãos e o que pede céu, esta vontade do céu  manifestada em Fátima, em outras palavras, Deus, para introduzir no coração dos cristãos a devoção ao Imaculado Coração de Maria, que tem muitas dificuldades para prevalecer. No entanto, não é tão difícil; Ele é tão bonito, tão reconfortante! E vemos esta grande batalha entre o demônio e Deus, sendo as almas o campo de batalha, as almas que Deus queria ganhar, mas não pela força. Enquanto que poderia impor sua majestade, de tal forma que todos os seres humanos se prostrassem diante dele - é o que vai acontecer no fim do mundo, mas então será tarde demais.
A batalha deve ser realizada agora.

Portanto, devemos pedir a Deus para enviar graças para ganhar almas para Ele, e devemos colaborar neste esforço! A este respeito, vamos pedir muitas coisas. Nós pedimos que a Igreja reencontre todos os elementos que constituem a sua missão de salvar almas. A única coisa, a primeira e a única que importa à Igreja é salvar almas!

 

 Fonte: DICI - Entretien avec Mgr Bernard Fellay, 4 mars 2016, Menzingen (Suisse)


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