sábado, 24 de agosto de 2013

Essência e natureza de Deus

Diz-se de Deus que Ele é a vida, e não apenas um ser vivo, como se lê no Evangelho de João: “Eu sou o Caminho, a Verdade e a Vida”. Ora, a deidade está para Deus como a vida para o vivente. Deus é, portanto, a própria deidade.

Deus é o mesmo que sua essência ou natureza. Para entendê-lo é preciso saber que nas coisas compostas de matéria e de forma há necessariamente distinção entre natureza ou essência, e supósito. Isto porque a natureza ou essência compreende apenas o que está contido na definição da espécie; assim, humanidade  compreende o que está contido na definição do homem. È pelo que está contido na definição que o homem é homem, e é o que significa a palavra humanidade, isto é, aquilo pelo qual o homem é homem. Mas a matéria individual, com todos os acidentes que a individualizam, não está contida na definição da espécie; pois a definição de homem não contem esta carne, estes ossos, a brancura, a negritude etc. Por conseguinte, esta carne, estes ossos e os acidentes que determinam essa matéria não são incluídos na noção de humanidade, e no entanto estão incluídos no que é o homem. Segue-se que o que é o homem tem algo em si que a humanidade não tem. Assim, não são totalmente a mesma coisa homem e humanidade, mas a humanidade é entendida como sua parte formal; pois os elementos da definição, com relação à matéria individualizante, se comportam como formas.

Portanto, naquilo que não é composto de matéria e forma, cuja individualização não vem de uma matéria individual, isto é, dessa matéria, mas que individualiza pela própria forma, é necessário que esta forma seja supósito  subsistente. Logo nele o supósito não se distingue da natureza. Assim, como Deus não é composto de matéria e de forma, como já demonstrado, é necessário que Ele seja sua própria deidade, sua vida e qualquer outra coisa que a Ele se atribua.
 
A Essência e o existir

Hilário escreve: “O existir não é em Deus um acidente, mas verdade subsistente”. Por conseguinte, o que subsiste em Deus é o seu existir.
Deus não somente é sua essência, como foi demonstrado, mas também seu existir, é o que se pode provar de diversas maneiras:
Primeira. Porque o que existe em algo que não pertence à sua essência tem de ser causado ou pelos princípios da essência, como os acidentes próprios da espécie: o riso, por exemplo, pertence ao homem e é causado por princípios essenciais de sua espécie; ou como o calor da água é causado pelo fogo. Portanto se o próprio existir de uma coisa é distinto de sua essência, é necessário que este existir seja causado por algo exterior ou pelos princípios essenciais da coisa. Ora, não se pode dizer isso de Deus, porque dizemos que Ele é a causa eficiente primeira. Logo, é impossível que em Deus uma coisa seja o existir e outra a essência.
Segunda. Porque o existir é a atualização de qualquer forma ou natureza. Não se entende a bondade ou a humanidade em ato, a não ser enquanto as entendemos como existindo. É preciso então que o existir seja referido à essência, que é distinta dele, como o ato em relação à potência. E como em Deus nada é potencial, como já se mostrou, segue-se que nele a essência não é, portanto, seu existir.
Terceira. Porque assim como o que tem fogo não é fogo, tem o fogo por participação, também o que tem o existir e não é o existir, é um ente por participação. Ora, Deus é sua essência, já foi demonstrado. Portanto, se não fosse seu próprio, Ele seria um ente por participação, e não por essência. Não seria então o primeiro ente, o que é um absurdo. Logo, Deus é o seu existir, e não apenas sua essência.
 
São Tomás de Aquino – Suma Teológica Vol 1; Questão 3, artigo 3 e 4.

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